Se pondo em jogo
Nos últimos tempos observo a presença de componentes que trazem às experiências e vivências dos jogadores aos jogos.
Não que seja possível delimitar uma fronteira rígida entre jogadores e personagens (há boas discussões sobre avatar/jogador). Sempre estamos em jogo ao jogar (há questões filosóficas e antropológicas que não cabem nesse papo). Mas há jogos que contam com as memórias, afetos e emoções dos jogadores enquanto comandos de jogo.
Sinestesia, Efêmera, Jogo(s) da(s) Memória(s) e Amores da Vila do Caju são jogos que fazem parte desta abordagem, mas estes aspectos, identificados em roleplaypoems e jogos-diário, fazem-se cada vez mais presentes em mecânicas de jogos narrativos.
Tenho conversado com várias pessoas sobre este elemento na criação de jogos, e, após muitas anotações, as sistematizei em três comentários, mesclando falas e adições minhas.
1. Cautela. A presença de elementos que permitem o sangramento voluntário não garante um bom jogo. E até mesmo pode gerar certo "nariz em pé" ante outros jogos, supostamente menos pretenciosos.
Ser atravessado por uma experiência, além de não ser algo necessário, pode ser perigoso caso não haja mecanismos de mediação e avaliação deste burlar de fronteiras.
2. Sinceridade. Gostei de ouvir duas falas que se complementaram. A primeira disse que este elemento deve ser bem comunicado e orientado nos manuais e procedimentos do jogar.
A segunda afirmou que, quando joga, quer "ser enganada voluntariamente", e não levada numa viagem sem direção, que pode cair num "pântano de dor".
3. Controle. O terceiro comentário destacou o caráter lacunar de jogos narrativos, e como as ativações de processos (comandos) se dão quase exclusivamente por ações lógicos-matemáticas.
Grande parte da tradição dos jogos narrativos são jogos de controle (não cabe discorrer sobre isso agora), e a abertura aos atravessamentos efêmeros de quem participa reorienta a aleatoriedade de jogos.
Gosto de pesquisar, pensar sobre estes pontos e experimentar caminhos, mecânicas e outras propostas possíveis por meio de meus jogos.
Meus projetos atuais, Cruzos e A Trupe, são frutos destas experimentações. Cruzos, inclusive, será lançado dia 16/01. E você pode saber mais em catarse.me/cruzos